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A importância da música e o legado de D’Angelo, o homem que reinventou o soul

D’Angelo, o homem que reinventou o soul morreu nesta terça-feira (14). Um artista que transformou corpo, fé, desejo e política em música. Uma sonoridade que parecia antiga e nova ao mesmo tempo, cheia de personalidade, soul, espiritualidade e sensualidade.

As raízes

D’Angelo cresceu dentro de uma igreja na Virgínia. O pai era pastor, a música era oração. Mas, do lado de fora, ouvia hip-hop, funk, jazz. Essa fusão, do sagrado e do profano, começa a aparecer quando D’Angelo começa a compor, ainda adolescente, sozinho no piano. A alma da igreja e o groove da rua.

O nascimento do neo-soul

Nos anos 90, o R&B que até então era mais polido, mais genérico, dá espaço para um grupo de artistas que cria junto e traz a inventividade e o calor humano de volta.

Dentre eles, Lauryn Hill, Erykah Badu, Maxwell, D’Angelo, Jill Scott e muitos outros. Juntos, eles criaram o neo-soul:
um som orgânico, cheio de textura, com coração, verdade, novo, flertando com o soul clássico norte-americano.

D’Angelo era um dos principais rostos desse movimento.

“Brown Sugar” (1995)

O primeiro disco foi uma surpresa agradável e suave. “Brown Sugar” é uma delícia: tinha groove, melodia, carne e espírito. Era soul falando de amor e desejo com uma honestidade que quase constrangia. O público sentiu. A crítica entendeu. D’Angelo tinha chegado pra ficar. Destaque para as faixas “Lady” e “Me and those dreaming eyes of mine”.

(Foto: Getty Images)

“Voodoo” (2000)

Cinco anos depois, veio o “Voodoo”. Um disco gravado no lendário Electric Lady Studios, onde Jimi Hendrix gravava.
O som era sujo, vivo, espiritual. As baterias de Questlove tinham peso, os baixos arrastavam, o corpo balançava. Os vocais: impecáveis.

Era o auge de D’Angelo e, até hoje, um dos melhores discos de R&B de todos os tempo. Era mais do que um álbum, era um ritual. Um retrato do soul no século 21.

“Untitled (How Does It Feel)”

Desse disco, então, veio o clipe que mudou tudo. Um plano-sequência. Um corpo nu. Um olhar fixo. Nenhum cenário, nenhum truque. Só ele e a câmera, em silêncio.

Foi sensual, foi chocante, foi arte pura. Mas também foi o começo de um problema. O público começou a ver o corpo antes da música e isso incomodou o artista.

O preço do desejo

Nos shows, os gritos eram os mesmos: “Tira a camisa!”. D’Angelo se irritou. Se fechou. Ele dizia: “Não quero ser um símbolo sexual. Quero que ouçam minha música.” O homem tímido que só queria fazer arte tinha virado refém da própria imagem. E então, ele desapareceu. Para o nosso desespero.

(Foto: Getty Images)

O silêncio

Por mais de uma década, quase nada de D’Angelo. Sem shows, sem entrevistas, sem discos. D’Angelo enfrentou o peso da fama, os vícios, o espelho. Enquanto ele lutava pra se reencontrar, a influência só crescia. Mesmo em silêncio, D’Angelo seguia moldando o som de uma geração.

“Black Messiah” (2014)

Quando ele voltou, 14 anos depois, não foi só com música — foi com uma mensagem. “Black Messiah”, seu último disco lançado, é uma obra-prima política, espiritual e furiosa. Um grito sobre raça, fé, amor e resistência. Era o som de um homem e de um povo em busca de redenção. Mas sem deixar o amor e o sexo de lado. Foi o renascimento de D’Angelo. Faixas para escutar: “Sugah Daddy”, “Really Love” e “Betray My Heart”.

(Foto: Getty Images)

Os mestres

D’Angelo é herdeiro direto de Marvin Gaye, Prince, Al Green e Sly Stone. Quem bebe de fonte boa, o resultado é sempre o mesmo. De cada um, ele herdou um pedaço: o erotismo, a espiritualidade, o funk, a coragem. E quando o artista é bom, o resultado nunca é imitação. É alquimia. D’Angelo pegou tudo e transformou em algo só dele.

Os herdeiros

Hoje, a linhagem criada por ele é clara. Frank Ocean, Anderson .Paak, H.E.R., Solange, Beyoncé, Miguel e muitos outros. Todos ecoam o que D’Angelo ensinou: que vulnerabilidade também é força, e que groove e emoção nunca podem morrer e devem andar de mãos dadas. O neo-soul virou um universo e D’Angelo foi o ponto de partida.

O legado

D’Angelo é o elo entre o passado e futuro, corpo e fé, prazer e dor. Entre Marvin Gaye, Frank Ocean, passando muitas vezes por Prince, ele é a lembrança de que a música ainda pode ser humana, imperfeita, íntima, divina. O soul nunca morreu, ele só estava esperando o próximo acorde. Por mais artistas como D’Angelo para os nossos ouvidos e corações.

A música boa e a arte nunca morre.

(Foto: Getty Images)

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