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Falamos com Pélico sobre novo disco, processo criativo e cena independente

Pra começar, eu vou dizer / aqui é o nosso acerto de contas / sem a menor esperança / do tempo curar a doce ilusão / das coisas que vão se resolver“. São estes versos viscerais, que podem ser atribuídos a alguém farto, desenganado do amor, que abrem o álbum “Quem Me Viu, Quem Me Vê”. O trabalho, lançado no último mês de outubro, é o mais recente do cancionista paulistano Pélico.

Ele, que adora contas histórias, traz um bocado delas neste projeto. Por e-mail, falou ao Papelpop sobre sua maneira de criar, a qual descreve como um intenso processo transformador. Disse também que recebe um retorno otimista do público, com quem mantém uma relação duradoura de troca a partir de suas composições.

Não é difícil se sentir tocado. Pélico honra a cada trabalho o título de eterno artesão da palavra, de alguém que fala diretamente ao coração e que vem construindo uma discografia sutil, inteligente e genuinamente estrondosa. Não se poupa de sentir e faz isso transparecer em toda sua figura artística. Em voz, sons e imagem.

Nesta breve entrevista, o cantor falou sobre como enxerga a arte em tempos de cólera, revelou o que há em sua playlist e ainda nos mandou um recado sobre o show que realiza no Sesc Vila Mariana nesta sexta-feira (8), quando estreiam suas novas faixas. Não o bastante, analisou seu atual momento e se disse “um artista de seu tempo”.

Papelpop: “Quem me viu, quem me vê” nasce em um momento muito feliz, em que você celebra dez anos de carreira. Além disso, já há quem diga (tanto fãs, como a crítica) que este é o melhor álbum da sua carreira. Fazendo um balanço do que você conquistou até agora, o que significa este momento? 

Pélico: Fico muito feliz com a recepção inicial do disco e isso me dá pistas de que estou no lugar que eu gostaria de estar, ou seja, fazendo canções que ainda afetam as pessoas, no sentido radical do verbo, provocando sentimentos e emoções.

Acompanho seu trabalho há algum tempo e acho muito curioso o seu processo de composição. Como funciona, como foi trabalhar nas canções deste disco?

Eu sempre tive um ritual, um tanto quanto obsessivo: costumava viajar sozinho, me isolava em lugares distantes, um ensismamento exagerado para compor, me inspirar e concentrar.  Hoje este processo se dá de forma mais natural e espontânea. Pra você ter uma ideia, algumas das canções do disco, compus no dia da gravação. Isso mudou minha relação com o meu trabalho como compositor.

Há quem diga que a música ficou mais triste, mais calma nos últimos anos. Você, por outro lado, segue na contramão, com um disco mais extrovertido, até de certa forma explosivo. O que te motivou a seguir esse caminho?

Sou um artista do meu tempo. A arte é um reflexo do momento que vivemos, eu não fiquei imune a toda esta explosão que estamos atravessando no Brasil e no mundo. A canção “Machucado”, por exemplo, tem uma boa dose de melancolia, mas ela também é um convite à vida: então me abraça e toma um gole de cachaça e a gente sai com toda a graça tendo a vida pra viver.

Por serem letras muito pessoais, as pessoas tendem a se identificar de imediato. Alguém já te contou alguma história que tenha acontecido ao som de uma música sua, que tenha te marcado? Pode compartilhar com a gente?

Desde o disco “Que isso fique entre nós”, recebo muitas mensagens de pessoas dizendo que algumas músicas traduzem exatamente momentos íntimos de suas vidas. Difícil eleger qual desses relatos me tocaram mais, mas me lembro de alguns bem comoventes, como por exemplo, recebi dois e-mails de pessoas que estavam desenganadas da vida, e me disseram que aquelas palavras salvaram a vida delas. Acho que estas manifestações são a fonte maior de satisfação que um artista pode ter.

O seu trabalho também conversa muito com a obra de nomes canônicos da MPB como Belchior, Roberto Carlos e o próprio Lupicínio. Houve algum som específico que tenha te marcado, ou simplesmente te embalado durante a produção do álbum? O que você tem ouvido agora?

Sim, sou apaixonado por estes grandes cancionistas, certamente isso se imprime no meu trabalho. Ouvi muito durante a gravação do disco Simon & Garfunkel, Sergio Sampaio, Otto, Josyara, Ava e o próprio Belchior, e eles seguem comigo.

O álbum também traz duas participações especiais. Você gravou com Teago Oliveira e Negro Léo, dois músicos brilhantes. Como foi a experiência de estar ao lado deles em estúdio?

Sou muito fã dos dois, Teago tem uma das vozes mais lindas da música brasileira atual, além de ser um baita compositor. Quando penso na palavra artista, me vem um nome à cabeça: Negro Léo. Ou seja, ter a participação deles no meu disco, é uma celebração.

Um outro ponto interessante do seu trabalho é o som. “Quem Me Viu Quem Me Vê” traz uma sonoridade mais densa, uma pesquisa que ruma a novos horizontes. Quais foram as suas referências aqui?

“Quem me viu, quem me vê” é um disco mais espontâneo, fluido e urgente. Não me preocupei com referências pra buscar a sonoridade do disco, Dudinha e Regis Damasceno (produtores do disco) também foram cúmplices deste caminho mais livre.

Há mais ou menos um ano e meio você lançou uma campanha de financiamento coletivo pra poder lançar esse álbum. Nós temos vários trabalhos que só foram possíveis a partir de iniciativas como essa e do apoio do público… Como você enxerga o cenário atual, principalmente levando em consideração as lutas da música independente em meio ao caos e a demonização da cultura?

Eu me sinto privilegiado em poder contar com o apoio daqueles que apreciam o meu trabalho, ou daqueles que simplesmente prezam pela manutenção da produção artística. Em um país onde o Estado não oferece mínimas condições de vida para os seus cidadãos, a arte pode parecer um objeto de luxo, e aí reside o engano intencional de manter o não acesso a cultura, porque sabemos, ou deveríamos todos saber, que a arte é a identidade de um povo e umas das formas mais autênticas de resistir.

Nesta sexta você se apresenta em São Paulo, faz a estreia ao vivo do disco. O que podemos esperar?

Hoje, no auditório do Sesc Vila Mariana, teremos a participação de Negro Léo, João Erbetta na guitarra, Pedro Pelotas nos sintetizadores e violão, Meno Del Picchia no baixo e Clayton Martin na bateria. Não esperem, venham!

 

O show de estreia de “Quem Me Viu, Quem Me Vê” acontece nesta sexta-feira (8) no Sesc Vila Mariana, em São Paulo. O álbum está disponível em todos os streamings:

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