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Se quem vende mais está no Grammy, por que o Ed Sheeran foi esnobado?

A cada edição, o Grammy demonstra mudanças estruturais, e isso está fazendo o prêmio ficar um pouco mais interessante. A maior festa da indústria da música tinha uma regra meio chata. Um tanto entediante. O artista vendeu muitos discos na temporada passada? Então vai levar alguns gramofones dourados para a sua casa. Em resumo é/era isso.

A regra sempre foi bem clara e, por conta disso, tivemos algumas boas injustiças durante a história da premiação. Em quase seis décadas, o Grammy não soube dosar muito bem na balança da venda de álbuns versus representatividade do artista no momento. De qual gravadora o artista pertence versus inovação dentro de um estilo. Ou, até mesmo, não dar um prêmio para o artista que tem um empresário forte em investimentos.

Por conta de alguns entraves nebulosos, artistas do quilate de Mos Def, Bob Marley, 50 Cent ou Jimi Hendrix não ganharam um prêmio em vida (ou morte). Led Zeppelin e Lupe Fiasco ostentam a esquálida marca de um (01) Grammy. Em 2016, o público e crítica esperavam uma enxurrada de prêmios para Beyoncé por conta de “Lemonade”, mas o que vimos foi a Adele bater todas as estatuetas e ficar constrangida pela escolha da academia.

A academia deve ter em seu quadro um equilíbrio entre consagrados nomes da música e boas promessas para que não tenhamos bizarrices na cerimônia. Apesar do rap movimentar uma legião de fãs e vender números assombrosos desde o fim dos anos 70, a categoria passou a existir no Grammy apenas em 1996! Tiveram que ver o Tupac morrer e pensar: “É, parece que a parada é séria. Vamos colocar uma categoria de rap no ano seguinte, certo?”.

Edição 2018

A premiação tem duas horas de exibição para ficar dentro dos formatos televisivos, pois, afinal, quem conseguiria assistir à entrega das 84 categorias que o Grammy tem? Ninguém. Dentre as principais deste ano existe um bom balanço entre velha e nova guarda. Mas sempre tem alguns detalhes para prestarmos um pouco mais de atenção.

Eu não vou falar do que destoou dentre as oitenta categorias, mas vamos pegar as principais categorias: Gravação do Ano e Música do Ano.

O que ficou um pouco forçado foi a inserção do Jay-Z em tantas categorias. O marido da Beyoncé está em oito! Ok, ele é um dos maiores nomes da história do rap e a premiação quer deixar claro – e cobrir um pouco do passado tosco sobre este tipo de música. Mas “4:44” talvez não fique entre os dez melhores discos da carreira de Mr. Carter. É um bom trabalho, sem dúvidas. Mas para quem lançou “Blueprint”, “Watch the Throne”, “Black Album”, “American Gangster” é de se esperar algo fora da curva. “4:44” não é.

Além da indicação inflada de Jay-Z, a ausência de Ed Sheeran em algumas categorias como Gravação do Ano ou Música do Ano é estranha. Com “Shape of You”, o cantor bateu recordes no mercado físico e digital. Esta é a cantiga mais ouvida da história do Spotify com mais de um bilhão e seiscentos milhões (e contando) de reproduções na plataforma. A venda no mercado tradicional também foi grande com mais de 200 mil cópias na primeira semana, deixando o cantor por mais de três meses no topo entre os singles mais vendidos do Reino Unido. Com tantas credenciais, por que ele ficou de fora? Se formos pegar os demais indicado na categoria de Gravação do Ano, “Shape of You” poderia estar na disputa de forma tranquila:

“Redbone” – Childish Gambino
“Despacito (feat Justin Bieber)” – Luis Fonsi & Daddy Yankee
“The Story of O.J” – Jay Z
“HUMBLE” – Kendrick Lamar
“24k Magic” – Bruno Mars

Se tem alguma música que vamos lembrar de 2017 é “Despacito”, ok.
“HUMBLE” foi o single escolhido por Kendrick Lamar para promover “Damn”, ok.
“24 Magic” é uma das músicas que mais tocaram nas rádios norte-americanas, ok.

Se “Shape of You” tivesse que entrar, seria no lugar de Jay-Z ou Childish Gambino.

“The Story of O.J” é uma das melhores músicas do disco “4:44” (tem um lindo sample de Nina Simone) e resgata um assunto delicado na história racial dos Estados Unidos. O O.J que ele se refere é o O.J. Simpson, um dos mais famosos jogadores da NFL que foi acusado de matar a sua ex-mulher, Nicole Brown, e seu amigo. O crime gerou grande debate no país não apenas pela violência e pela celebridade do acusado, mas pelo fato de ele ser negro e rico; e as vítimas, brancas.

Childish Gambino lançou o seu disco “Awaken, Love!” no finalzinho do ano passado e, por conta disso, ficou de fora de algumas listas de fim de ano. É um disco pop/R&B delicioso de se ouvir. Por mais que ele tenha tido um número de vendas alto para o segmento, eu não acreditei que apareceu nestas categorias mais garbosas. Por mais que ele tenha uma carreira sólida como cantor, DJ, roteirista e ator, Childish Gambino é um mero artista indie comparado com o resto.

O Grammy bancar estas duas músicas e deixar de fora uma música tão representativa para indústria indica mudanças na premiação. Será que agora que o artista que mais vendeu não terá o mesmo peso? Vamos acompanhar no final de janeiro se este discurso se sustenta.

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O jornalista paulistano, produtor musical e marketeiro Brunno Constante analisa, pondera, escreve e traz novidades sobre música no Papelpop todas as terças-feiras.

Fita Cassete é o alterego de Brunno quando ele fala sobre o assunto.

Quer falar com ele? Twitter: @brunno.


* A opinião do colunista Brunno Constante não necessariamente representa a opinião do Papelpop. No entanto, por aqui, todas as opiniões são bem-vindas. :)

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